terça-feira, 26 de janeiro de 2016

Quem paga a conta das crises econômica, social, política e ética do Brasil?

fonte: Jusbrasil

http://professorlfg.jusbrasil.com.br/artigos/228069851/quem-paga-as-contas-das-nossas-crises?ref=topic_feed

1. Crise política (corrupção e antirrepublicanismo):
“Hoje [Desde sempre, diria João Francisco Lisboa, Jornal de Timon], os partidos estão mais preocupados em repartir verbas e brigar por poder do que em defender ideias. O sistema político brasileiro fracassou, e fomos todos responsáveis [itálico nosso]. Precisamos mudar esse sistema, já que ele não teve condições de se regenerar” (FHC, O Globo26/8/15: 6).
Mas essa crise política e partidária não é a única. Tampouco está isolada da crise econômica. O pensamento pobre ou preguiçoso (por exemplo: o pensamento bipolar encarniçado) só consegue ver a ponta do “iceberg”, não o problema como um todo. Brasil vive concomitantemente cinco crises: política, econômica, social, jurídica e ética.
Não se trata de uma crise econômica cíclica (como as que acontecem no mundo da economia). As nossas crises não são cíclicas, são sistêmicas. Com todas as letras é preciso ser dito: estamos imersos numa grave conjuntura que pode desembocar numa autêntica convulsão social, que retratará o fim de um enorme ciclo histórico, caracterizado por uma indecente e equivocada forma de organização social, dominada por senhores neofeudais que integram as elites dominantes detentoras dos poderes econômico, financeiro, ideológico e político.
As duas únicas coincidências entre as crises atuais e as anteriores são as seguintes: (1) a conta novamente está recaindo sobre os ombros de quem sempre a pagou - trabalhadores, precariado, assalariados - (sem nenhuma novidade, até aqui); (2) as elites dominantes, outra vez, mesmo nos momentos de crises agudas, continuam acumulando riquezas imensas, que crescem exponencialmente, na mesma medida dos seus privilégios (sobretudo o de dividir o Orçamento Público da maneira que lhes convém).
A declaração do maior banqueiro do país (Roberto Setúbal) de apoio ao atual governo elimina qualquer dúvida sobre o quanto as elites (ou a maior parte dela) estão satisfeitas com o momento crítico (de desemprego, trabalho precário, perda da qualidade de vida etc.) vivido por milhões de brasileiros.
A concentração de renda (denunciada por Picketty) continua gritante (nosso Gini de 0,51 é praticamente idêntico ao de 1960, que era de 0,53), o que significa o incremento avassalador das desigualdades. A diferença, agora, é que milhões de brasileiros já conseguiram passar por bancos universitários, o que implica naturalmente mais conscientização da nossa profunda desigualdade distributiva.
2. Nossas crises ao longo da História:
“O que ocorreu depois [da eleição do Lula] foi o reforço do compadrio, do familismo político e do nepotismo renitente, bem como da conciliação contumaz dos donos do poder. Conciliação que rebrota sempre e quando seus interesses estejam em jogo, tudo empapado no charco do negocismo pedestre e explícito” (Carlos Guilherme Mota e Adriana Lopez, História do Brasil: uma interpretação, p. 978).
3. Crise econômica e capitalismo selvagem:
“Toda riqueza provém do pecado. Ninguém pode ganhar sem que alguém perca. Se o pecado não foi cometido pelo atual proprietário da riqueza, então a riqueza é produto do pecado cometido pelos seus antepassados” (São Jerônimo, século IV – apud (F. Giambiagi, Capitalismo: modo de usar, p. 98).
A resposta a essa colocação radical deu-a F. Giambiagi (Capitalismo: modo de usar, p. 99): “É ingênuo acreditar que a procura do lucro é incompatível com a satisfação de doses elevadas de bem-estar social [veja a situação de países como Canadá, Nova Zelândia, Austrália, Finlândia, Dinamarca, Noruega, Suécia etc., que combinam capitalismo com excelente distribuição de renda]. É perfeitamente possível ter um sistema econômico baseado na iniciativa privada, onde os agentes se guiam pela obtenção de lucro e, como resultado da ação coletiva de n atividades individuais, o nível de satisfação social ser maior do que numa sociedade onde, teoricamente, o objetivo de todos é o bem-estar coletivo”.
4. Crise social (desigualdades e suas consequências):
“As sociedades avançadas não terão como evitar a ampliação dos programas de transferência de renda, para garantir um nível mínimo de qualidade de vida aos menos favorecidos. O desafio é como fazê-lo sem aumentar o peso do Estado, que dá sinais claros de estar perto de atingir o limite do administrável. No Brasil, o Estado é caro como nos países mais desenvolvidos e incompetente como nos mais atrasados (André Lara Resende, http://oglobo.globo.com/economia/mais-pobres-são-os-mais-afetados-por-recessao-17354752#ixzz3kUiPirsT). O problema, como se vê, não é capitalismo distributivo (que funciona muito bem em países como os escandinavos), sim, como fazê-lo (num país em que o Estado é visto como se fosse uma empresa a mais, destinada a proporcionar lucros e privilégios para apenas alguns senhores neofeudais).
5. Crise jurídica (ineficiência da Justiça – ausência do império da lei):
A operação Lava Jato vai mudar o cenário da corrupção no Brasil? É muita inocência pensar que isso fosse possível. Recentemente Dilma Rousseff disse que o escândalo da Petrobras vai mudar o Brasil para sempre. A Petrobras é só um sinal do quanto existe de corrupção em praticamente todos os órgãos e agências públicas brasileiras. A atuação da Justiça no caso Lava Jato é só um sinal do quanto se pode fazer para tornar o império da lei igual para todos alguma coisa mais tangível.
O Brasil já viveu milhares de escândalos e não mudou nada até agora. Como não ser cético se a Petrobras ocorreu depois do impeachment do Collor, dos anões do Orçamento, do caso Sivam, da compra de votos para a emenda da reeleição de FHC, do Banestado, dossiê Cayman, das obras do Fórum Trabalhista de São Paulo, do caso Celso Daniel, dos mensalões tucano e petista, dos sanguessugas, da operação Navalha, do Renangate, do caso Daniel Dantas, da Coroa Brastel (que já prescreveu) etc.
Como bem sublinhou H. Schwarstman (Folha), “seria decerto um exagero afirmar que nenhum deles teve consequências, mas parece lícito concluir que mesmo aqueles que resultaram em punições exemplares ficaram muito aquém de representar uma mudança de paradigma. Basta dizer que o mensalão não impediu o petrolão, muito pelo contrário”.
6. Crise ética (sociedade pouco comprometida):
“Nosso problema [sobretudo em países com a formação história hierarquizada e racista como o Brasil] é o mundo, sem nós” (Marcus Faustini, O Globo 1/9/15: Segundo Caderno, 2).
Mas tudo isso significa que não pensamos ou fazemos nada junto com o outro? Não. Três exemplos: “no pensamento político, ungimos a utopia capaz de religar um passado original a um futuro idealizado produzindo o sentido de estar vivo no presente rumo a esse futuro; Na prática humanitária, criamos a solidariedade, uma ação com aqueles que não possuem o que possuímos e podemos doar; Na cooperação social, o mutirão como forma de fazer algo juntos que supere a falta de condições técnicas ou econômicas para realização de um bem comum. Todos esses acima são exemplos de bons sentimentos, boas posturas, boas ações. Foram capazes de inspirar momentos decisivos da humanidade e inspirar sujeitos ou projetos coletivos que foram disruptivos em nossa história” (Marcus Faustini, O Globo 1/9/15: Segundo Caderno, 2).
Mas qual o problema? “Todas essas práticas hoje nos guiam muito mais a posturas de aproximação com quem é próximo de nós. Somos seletivos em nossa solidariedade, em pensar em quem desejamos ter conosco em nossa ilha utópica ou por quem dedicaríamos um mutirão” (Marcus Faustini, O Globo 1/9/15: Segundo Caderno, 2).

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