domingo, 16 de agosto de 2015

Trecho do Livro "As Crônicas de Ravok"

Quarta Crônica: Esperança




Quando a Igreja Católica ficou tão corrupta que se aliou aos reis europeus no genocídio dos índios da América por lucro, os políticos da Cidade dos Anjos disseram que a guerra contra os principados e potestades de Lúcifer era mais importante.
Assim, enquanto índios e africanos morriam de doenças causadas pelo trabalho em minas de extração de  prata, estanho, ouro... morriam em lavouras, assassinados, ou de doenças trazidas pelos invasores, os anjos políticos ordenavam que as falanges não interferissem.
Quando as civilizações maia, inca e asteca foram destruídas e substituídas por favelas, esses anjos filosofaram argumentando que era o preço pela divulgação do Evangelho no Novo Mundo ( os fins justificam os meios, blá blá blá...).
Quando os judeus começaram a ser exterminados pelos nazistas e o Vaticano e as igrejas protestantes não fizeram nada, os anjos políticos responderam que esse era o preço que os judeus tinham que pagar por não terem aceitado Jesus: “Os judeus não disseram que o sangue Dele deveria cair sobre eles e seus filhos? Cuidado com o que diz...”
Hoje, os israelenses mostraram que não são tão anjinhos como afirmam. Matam os palestinos (“dizimam”, no mal sentido) para os “novos nazistas”, os estadunidenses. Os anjos dizem que é melhor lidar com os EUA que com a “ameaça islâmica”. Pode isso?
Sou irmão deles, servimos a Deus, mas acho que eles são piores que os demônios. Sempre achei que o Inimigo criou a Política.
Meu nome é Ismael.

* * *

Por toda a Terra, o lucro é o responsável pelos maiores pecados. Milhões de pessoas são escravizadas por centenas; têm seu acesso à saúde, educação, alimentação, emprego, moradia, etc, limitado pelos seus escravizadores. A minoria se torna bandido, sendo morta pelos assassinos criados pelos próprio sistema. A maioria se conforma com sua situação, ajoelhando-se a Deus ou ao seu Inimigo, pedindo uma saída para seus problemas.
Crianças morrem para que ricaços insensíveis andem de limusine. O Homem destrói a própria Casa em troca de lucro. E eu?
Eu estou me lixando.
Meu chefe é o deus do capitalismo, Mammom. Sábio, invencível e absoluto, ele não teme Deus ou o diabo. Quem sou eu? Ravok, um dos muitos deuses da Internet. Pequeno, mas respeitado. Já lutei contra anjos, demônios, magos, deuses, homens, tudo para manter Mammom onde está. Enquanto ele permitir que alguns humanos me adorem, continuarei a existir e isso me basta.

* * *

Levei o caso para Deus e Ele ordenou-me que não interferisse com a escalada de Mammom rumo ao controle da Terra. Como pode Ele, criador de tudo, se omitir diante disso? Mesmo sendo meu Pai, como pode me ordenar que ignore tanta dor, tanta exploração?
Sou o anjo Ismael e estou confuso.

* * *

Os líderes comunistas, em sua maioria, fingem se preocupar com a fome do povo. Eles só querem chegar ao poder. Por outro lado, não vejo o povo explorado como coitadinhos. Todo mundo, quando consegue algum poder, passa a explorar os outros.
Eu não tenho pena dos oprimidos. Eu sou Ravok.

* * *

Eu resolvo desobedecer aos meus superiores e ao meu Pai. Reúno uma falange de anjos que pensa como eu e passo a atacar empresas que destroem o meio ambiente, bancos, etc. durante meses, nosso grupo consegue muitas vitórias. Punimos humanos e demônios que enriquecem à custa de inocentes.
Eu estou feliz. Eu sou Ismael.

* * *

Mammom me ordena destruir anjos que estão prejudicando muito seus negócios. Levo algumas semanas para encontrar o líder, Ismael. Após uma emboscada mal sucedida e horas de luta, ele me põe para correr.
Espero muito por um descuido dele, para armar outra cilada. Faço o grupo dele se dividir com uma distração simples ( coloco vários humanos inocentes em perigo de morte). Quando o encontro sozinho, o atinjo rápido e sem piedade. Ele está muito ferido e à beira da morte.
─ Quem é você? ─ ele me pergunta.
─ Você se meteu com quem não devia. Sou o carrasco contratado para eliminá-lo.
─ Não vou implorar misericórdia.
─ Você não sabia o que estava fazendo? Quem é meu chefe?
─ Alguém precisava resistir a ele. A Terra não vai durar muito mais...
Fico com pena dele por sua ingenuidade, mas admiro sua coragem. Infelizmente, não posso deixá-lo ir.
Decido transformá-lo numa árvore belíssima, batizando-a de Esperança, em homenagem a ele. Eu sou Ravok. Faço o que é preciso para sobreviver. Um deus precisa de adoradores. Mammom me permite tê-los. Mas não significa que eu seja sádico, que sinta prazer com o sofrimento dos outros.


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